MEMÓRIAS DA GUERRA
As notícias sobre a crescente tensão na Península Coreana e a ameaça de uma nova guerra na região leva-me sempre de volta a Seul e à visita que fiz recentemente ao seu museu e memorial de guerra.
O museu é dedicado ao conflito que levou à separação efectiva e permanente das duas Coreias.
Para percebermos como isso aconteceu é nos explicado que após a conclusão da Segunda Guerra Mundial em 1945, a Península Coreana - que desde 1910 era controlada pelo Japão - foi “temporariamente” dividida ao longo do paralelo 38 pelos EUA e pela União Soviética. Esta divisão colocou os Estados Unidos como a força governante no sul e a União Soviética como o poder governante no norte.
E foi deste ambiente de Guerra Fria que resultou a Guerra da Coreia.
A Coreia do Norte (com a garantia da União Soviética) invadiu a Coreia do Sul na tentativa de reunificar a nação pela força. As Nações Unidas, lideradas pelos Estados Unidos, intervieram e depois de três anos de guerra um cessar-fogo foi negociado e a divisão da península aproximadamente ao longo do mesmo paralelo 38 foi acordada.
O cessar-fogo e a divisão ainda são válidos hoje e as pessoas da Coreia do Sul estão muito conscientes dos sacrifícios que foram feitos para preservar sua liberdade. O Memorial da Guerra da Coreia é testemunho deste processo que dividiu um país, as suas famílias e ceifou centenas de vidas
Localizada no canto sudoeste da área de exposição ao ar livre está um memorial que é conhecido como “Os Irmãos” que me tocou especialmente.
A obra, esculpida com muita sensibilidade, simboliza a Guerra da Coreia e a esperança de reunificação. A estátua retrata uma cena em que o filho mais velho de uma família, um soldado sul-coreano e o seu irmão mais novo, um soldado norte-coreano se encontram num campo de batalha e se abraçam. O seu abraço expressa reconciliação, amor e perdão.
Os dois irmãos estão em cima de uma colina com uma racha que simbolisa a divisão do país. No seu interior há um bonito painel em mosaico que retrata momentos da guerra.
Esse desejo de uma reunificação pacífica da Coreia é visível também no “Relógio”.
Nesta obra duas jovens seguram relógios. Um simboliza a guerra e outro a paz. Ambas estão em cima de uma pilha de armas antigas e enferrujadas. Uma menina segura um relógio que parou no dia, mês, ano e hora em que a guerra começou entre as duas Coreias, ela olha para baixo. A outra menina olha para cima, e segura um relógio que continua a funcionar e que só irá parar quando as duas Coreias se reunirem novamente.
“Defender a Pátria” é outra obra impressionante onde mais de 30 estátuas retratam pessoas de todos os sectores da sociedade que superaram a Guerra da Coreia. A dor e o sofrimento causados pela guerra está bem patente nas suas expressões.
Um pouco mais à frente no jardim existe uma grande área de exposição onde podemos ver de perto muita artilharia militar - tanques, helicópteros, mísseis, barcos e aviões.
Quando aqui estive reparei que muitos grupos de crianças vinham com as escolas visitar o museu. Os miúdos, naturalmente, riam e divertiam-se a subir e descer dos tanques e aviões que estavam em exposição. Até eu me diverti a tirar fotografias fingindo pilotar um antigo caça ou disparando artilharia pesada.
Eles, tal como eu estavam despreocupados e confiantes. O horror da guera estava muito longe e aqueles equipamentos não eram agora mais que brinquedos grandes. Uma lembrança de um passado distante.
Dentro do museu, os filmes a preto e branco, as fotos, mapas e artefactos antigos que documentam as principais batalhas e eventos da Guerra da Coreia ajudam a consolidar a ideia que tudo aconteceu há muito, muito tempo.
Os jovens Sul Coreanos não me pareceram levar muito a sério as ameaças da Coreia do Norte (leiam aqui), mas a verdade é que lembretes da guerra e do impasse que daqui resultou ainda surgem um pouco por todo lado. Vemos máscaras de gás no metro ou exercícios de mobilização civil na rua. A sombra da guerra continua por lá...
Espero de coração que os poderes envolvidos neste conflito e os seus dirigentes tenham todos bom senso, que a história, por uma vez, não se repita e que a guerra na Peninsula Coreana se mantenha uma memória distante.
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